terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Alheiras resistem à crise - Mirandela

Produto continua a ser muito requisitado no mercado e a produção em 2008 registou um aumento.

“Ser um produto certificado e com um preço ainda acessível para as bolsas” são as razões encontradas pelo presidente da Associação Comercial e Industrial de Mirandela (ACIM), entidade gestora, para esta imunidade à crise conjuntural. Para além disso, “o selo de certificação é uma garantia de segurança para o consumidor, além de diferenciar a qualidade dos produtos com protecção comunitária dos restantes”, acrescenta Jorge Morais. O dirigente associativo não tem dúvidas em afirmar que a alheira de Mirandela “é o produto que mais riqueza trás para o nosso concelho”. Uma situação confirmada por Joel Dias, um habitante de Vila Nova de Gaia que encontramos a sair de uma loja de produtos regionais com um saco de plástico cheio de alheiras. “Cada vez que passo por Mirandela não vou embora sem levar uns quilinhos de alheiras lá para casa, para a família e amigos”, afirma. Este cidadão é apenas um dos muitos turistas que visitam a cidade de Mirandela, sobretudo aos fins de semana, e não regressam sem levar vários quilos deste enchido tradicional, ex-libris da cidade. “É certamente o produto que traz maior riqueza para o concelho”, garante Jorge Morais, presidente da direcção da Associação Comercial e Industrial de Mirandela (ACIM). Constatamos, junto dos produtores e de empresários do sector, que a crise não chegou às alheiras de Mirandela. Os irmãos Cepeda (Rui e José) da empresa Eurofumeiro não têm dúvidas em afirmar que “o ano de 2008 foi excelente” para os produtores deste enchido tradicional. Segundo estes empresários, a receita para este sucesso está na confiança que o produto tem no mercado e também “porque estamos a falar de uma refeição muito económica, se tivermos em conta que um quilo de alheiras dá para uma refeição de uma família com um agregado familiar médio”. Este sector teve de se adaptar a novas regras. Do processo de fabrico artesanal passou-se para o industrial e com ele novas exigências de segurança alimentar rigorosas, que tiveram de ser acompanhadas com um forte investimento em equipamentos e formação do pessoal. Em 2008, esta empresa produziu uma média mensal de 90 toneladas de alheiras, “com um final de ano absolutamente fantástico que chegou às 108 toneladas”, diz José Cepeda. Comparativamente a 2007, a empresa aumentou cerca de dez por cento a produção da alheira. Uma situação que é confirmada pelos empresários do sector que têm pontos de venda ao público na cidade transmontana. “Não há dúvida que a alheira de Mirandela é uma referência da nossa cidade e a maioria das pessoas que nos visita pede esse enchido”, refere Maria do Céu, proprietária de um dos dez estabelecimentos comerciais de produtos regionais que estão instalados num perímetro de cerca de 500 metros, em pleno centro da cidade. Estas lojas nunca fecham as portas, nem mesmo aos domingos e feriados. Aliás, o domingo é muitas vezes o melhor dia da semana, porque são muitos os turistas que visitam a cidade, através de excursões organizadas ou mesmo nas viaturas particulares. “Já houve domingos em que se vendeu mais de 500 quilos de alheiras”, conta Maria do Céu. Os meses de Fevereiro e Março são sempre muito bons, porque há muita gente que visita a região para ver as amendoeiras em flor e aproveitam para comprar a alheira de Mirandela. Mas, “o melhor mês do ano é sempre o de Agosto, devido à vinda dos emigrantes”, acrescenta esta empresária que vende alheira tradicional, certificada e de caça. Esta procura do enchido mirandelense tem um efeito multiplicador, porque “as pessoas levam a alheira para as suas localidades e dão a provar a familiares e amigos que depois telefonam a encomendar”, afirma José Carlos Teixeira, que também abriu uma loja de venda de produtos regionais há cerca de quatro meses. Aqui só pode encontrar-se alheira certificada e de caça. “Continuo a pensar que a preservação da qualidade da alheira de Mirandela só será possível se apostarmos exclusivamente no produto certificado”, afirma.

Produto certificado ETG
A Alheira de Mirandela tem o registo provisório de produto específico de Especialidade Tradicional Garantida (ETG), mas a ACIM já requereu a passagem a Identificação Geográfica Protegida (IGP), porque “permitirá dar mais valias para os produtores da região”, assegura o presidente da direcção da ACIM. No entanto também “pode diminuir algumas atrocidades que existem pelo país”, diz Rui Cepeda, referindo-se à venda de enchidos com colagens à alheira de Mirandela. “Falta fiscalização e maior rigor”, acrescenta o empresário. Actualmente, com o registo de ETG, qualquer empresa do país pode produzir alheira de Mirandela, desde que cumpra o caderno de especificações que determina que este produto tem de ter como principais ingredientes a carne e gordura de porco, a carne de aves (galinha e/ou peru) e pão de trigo, o azeite e a banha, condimentados com sal, alho e colorau doce e/ou picante. Podem ainda ser usados como ingredientes a carne de animais de caça. É um enchido com formato de ferradura, cilíndrico, sendo o interior constituído por uma pasta fina na qual se apercebem pedaços de carne desfiadas e cujo invólucro é constituído por tripa natural, de vaca ou de porco. As carnes são preparadas, sendo cortadas em pedaços de tamanho médio, temperadas e deixadas a repousar. São depois cozidas, arrefecidas e desfiadas, operação fundamental para as características do produto final. Seguidamente, corta-se o pão em fatias finas com côdea, que são depois amolecidas na calda, e prepara-se a massa, ou seja, adicionam-se e misturam-se os ingredientes e acertam-se os condimentos. Depois de preparada a massa, enchem-se as tripas secas ou salgadas de vaca ou porco e atam-se em forma de ferradura. Por fim, tem lugar a fase da fumagem, que é feita com lume brando de madeira de oliveira, durante, pelo menos, oito dias.

O que mudará com a IGP
Tendo em conta que a produção da alheira de Mirandela requer carne de porco da raça Bísara (ou cruzamento com esta raça, desde um dos progenitores seja desta raça), a área geográfica de produção de matéria-prima fica assim também naturalmente delimitada à área de exploração do porco de raça Bísara, designadamente os concelhos de Alijó, Boticas, Chaves, Mesão Frio, Mondim de Basto, Montalegre, Murça, Régua, Ribeira de Pena, Sabrosa, Santa Marta de Penaguião, Vila Pouca de Aguiar, Valpaços e Vila Real, do distrito de Vila Real. No distrito de Bragança, os concelhos de Alfândega da Fé, Bragança, Carrazeda de Ansiães, Freixo de Espada à Cinta, Macedo de Cavaleiros, Miranda do Douro, Mirandela, Mogadouro, Torre de Moncorvo, Vila Flor, Vimioso e Vinhais. Tendo em conta as condições climáticas requeridas para a transformação da alheira de Mirandela, nomeadamente as necessárias à realização do processo de fumagem, no qual é utilizada lenha típica da região (carvalho e oliveira), o saber fazer das populações baseado em métodos locais, leais e constantes, o uso do pão regional de trigo, cujo segredo de fabrico permaneceu inalterado ao longo de múltiplas gerações de padeiros, a área geográfica de transformação e acondicionamento está circunscrita ao concelho de Mirandela.

Como são confeccionadas
As alheiras de Mirandela não são consumidas tal qual, devendo ser grelhadas ou assadas, de preferência, em "lume de carvão", acompanhadas com batatas e legumes cozidos. Mas também podem ser estufadas, depois de envolvidas em couve lombarda.

In www.mensageironoticias.pt/noticia/1262

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