quinta-feira, 19 de junho de 2008

Cidades, criatividade e inovação urbana

Num mundo cada vez mais globalizado e onde a competitividade é cada vez maior é fundamental uma mudança nas atitudes e na forma como se planeiam as cidades, nomeadamente no interior.
As intervenções recentes nas cidades e, em particular, nas cidades transmontanas prendem-se muitas vezes com as questões da Cultura e do Turismo, contudo é necessário ser mais profissional com estas questões dado que são os sectores onde há mais amadorismo ao nível municipal, pois se há áreas nas câmaras onde se gasta mal o dinheiro é na Cultura – Vila Real tem sido uma excepção.
Sendo certo que o crescimento das cidades tem tido uma evolução significativa nas últimas décadas e com certeza continuará a ser, um dos aspectos fundamentais, na região de Trás-os-Montes, prende-se com a ideia do "orgulho" na pertença a uma determinada cidade ou região pela sua cultura antropológica que a diferencia na sua valorização e na competição territorial, contudo importa ser mais criativo.
É, pois, necessário construir e reconstruir as cidades a partir de projectos mais criativos e com maior impacto em termos de visibilidade e atractividade. Estas intervenções ditas “criativas/imaginativas” não devem ser deixadas exclusivamente aos intelectuais e eruditos que detêm o conhecimento, sendo necessário promover um maior diálogo com as populações interessadas e possivelmente envolvidas no processo.
A construção das cidades deverá ter por base a constituição de espaços vibrantes, onde dê gosto viver, estudar e trabalhar, em particular pela qualidade dos espaços urbanos, pela dinâmica artística e cultural, pela aposta no desenvolvimento tecnológico e pela diversidade de negócios ligados à fileira cultural, tecnológica e urbana.
A aposta em politicas públicas ligadas à criatividade e à inovação urbana deverá apoiar-se numa atitude tolerante, que valorize a diversidade social e cultural, resultando numa atracção e fixação de talentos. Deverá existir também capacidade para se desenvolverem empresas inovadoras e competitivas, mas também instituições e pessoas mais criativas e inovadoras.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Acessibilidade aos serviços de saúde

A igualdade de oportunidades dos cidadãos no acesso aos equipamentos de uso colectivo e aos serviços públicos fundamentais por eles fornecidos é um direito constitucional e um princípio básico do “bom” ordenamento do território. Muito embora se tenha assistido, ao longo das últimas décadas, a uma melhoria em termos das dotações, da cobertura e da acessibilidade física a esses equipamentos, a verdade é que em muitas regiões do país, e em particular no Interior, os tempos médios de acesso estão ainda longe de corresponder aos padrões médios estabelecidos e usuais nos países desenvolvidos. Acresce ainda que as recentes políticas e medidas de racionalização das redes de infra-estruturas e de equipamentos vêm colocar na ordem do dia esta problemática, realçando-se o facto de muitas decisões não estarem suficientemente fundamentadas em estudos técnicos e metodologias adequadas.

As dinâmicas recentes têm ditado decisões políticas ora de abertura, ora de encerramento de serviços, segundo uma lógica de ajuste à procura/necessidades dos territórios. No sistema de saúde é necessário implementar ajustamentos na organização, tendo por objectivo garantir o bom funcionamento, tendo em conta o aumento da qualidade de vida das populações. O envelhecimento da população, a dispersão dos cidadãos e a desarticulação da rede viária, sobretudo nos municípios interiores, desaconselha a actual concentração do pessoal nos hospitais e centros de saúde e uma escassez em no restante território, em especial nos municípios fronteiriços, onde as condições de acessibilidade não permitem aceder de forma equitativa, nem satisfatória aos serviços de saúde. A satisfação e a qualidade dos serviços de saúde, sobretudo hospitalares, continuam a ser uma característica urbana, concentrando os recursos e equipamentos nas cidades, sobretudo nas de maior dimensão, enquanto no restante território se verifica uma escassez significativa, que não é equilibrada com as mínimas condições de acesso aos serviços de saúde.
Na região de Trás-os-Montes e Alto Douro um dos principais desafios é ultrapassar o espaço, garantindo à população o acesso às unidades de prestação de cuidados de saúde, devendo os equipamentos existentes funcionar em rede, permitindo a deslocação das pessoas ao serviço mais próximo, minimizando os elevados tempo de deslocação que alguns municípios apresentam, nomeadamente nos serviços hospitalares. Sobretudo nas regiões com problemas de despovoamento e envelhecimento populacional, o sistema de saúde deve garantir o acesso da população através de serviços de proximidade, com comunicações e/ou transportes que levem a população aos serviços ou os serviços às populações. É assim fundamental tomar decisões políticas, de compromisso e de solidariedade, pois nos casos de baixa densidade de ocupação, muitas vezes, não existe dimensão de procura suficiente para justificar investimento em serviços e equipamentos, que atendam às necessidades e direitos fundamentais das populações dessas áreas.
Se é certo que o despovoamento originou a diminuição do investimento público em alguns sectores básicos para a população nas regiões do interior, é fundamental equacionar a reorganização das redes de serviços existentes, mas tal deverá implicar a elaboração de estratégias planeadas, que devem ser imaginativas, flexíveis e adaptadas às realidades territoriais, permitindo o fornecimento de serviços sustentáveis que garantam condições mínimas de acessibilidade, sendo fundamental privilegiar os princípios de vizinhança e de complementaridade, estabelecendo acordos institucionais de modo a fomentar uma maior mobilidade de profissionais sanitários, nomeadamente entre as povoações fronteiriças. Quer com políticas de maior dotação ou/e políticas de maior mobilidade podem conduzir, a médio prazo, à melhoria dos actuais níveis de prestação de serviços nas regiões do interior. As estratégias e decisões de reorganização não devem ser elaboradas sob uma abordagem sectorial, mas devem ser integradas, nomeadamente no âmbito dos planos de ordenamento de território, considerando as especificidades territoriais existentes, evitando sobreposições de níveis de serviços fomentando a cooperação, tendo sempre em consideração os problemas inerentes à retirada dos serviços públicos das regiões do interior.

(Resumo e considerações finais do paper AZEVEDO, N.; RAMOS, L. (2006), “Acessibilidade aos Serviços Públicos em Regiões do Interior de Portugal: O Caso dos Serviços de Saúde na Região de Trás-os-Montes e Alto Douro”, 2.º Congresso Luso Brasileiro para o Planeamento Urbano, Regional, Integrado e Sustentável (PLURIS), 12p., Universidade do Minho, Braga. Texto integral da comunicação está disponível, no sítio do PLURIS2006 - http://www.civil.uminho.pt/planning/pluris2006/)

A desruralização em Trás-os-Montes e Alto Douro

No decorrer da última década (1991-2001), a região de Trás-os-Montes e Alto Douro (TMAD) acompanhou o processo de despovoamento e respectiva perda de importância do sector agrícola que se processou, com maior ou menor incidência, por todo o interior português. A população residente diminui mas o decréscimo da população agrícola familiar diminuiu quase para metade e consequentemente, o seu peso relativo na população residente diminui também, apesar de ainda apresentar um valor bastante elevado, sendo este processo mais tardio que na generalidade do território nacional. A desruralização da região é assim uma consequência do despovoamento, sendo este resultado da diminuição da população agrícola, mas também das migrações internas (campo/cidade) e consequente processo de concentração urbana.

É indiscutível que a região de Trás-os-Montes e Alto Douro tem vindo a recuperar algum do atraso relativo, visível numa clara melhoria da qualidade de vida das suas populações e no relativo dinamismo de alguns sectores económicos, com particular realce para o turismo, mas o problema fundamental do seu (sub) desenvolvimento têm-se mantido e tudo indica que se venha a agravar no futuro próximo. Todas as projecções demográficas revelam que a região continuará a perder população, atingindo uma parte cada vez mais significativa do território. Da mesma forma, as perspectivas para o emprego e a empregabilidade dos recursos humanos não são animadoras, pois as actividades produtivas consumidoras de mão-de-obra pouco qualificada (por exemplo, a viticultura) têm dificuldade em satisfazer localmente as suas necessidades. As actividades económicas, desenvolvidas por pequenas empresas ligadas a sectores tradicionais, sentem cada vez mais os efeitos da concorrência feroz e de políticas europeias pouco adaptadas às suas especificidades sectoriais e territoriais.
A produção agrícola é considerada uma das principais, senão a principal, vocação da região mas como assinalam a maioria dos autores, esta apresenta condições desfavoráveis para a sua prática, sobretudo quando comparadas com as de outras regiões onde se pratica uma agricultura intensiva. Estas condições determinam, em grande parte, as baixas produtividades e a consequente falta de competitividade de grande parte das produções agrárias da região. No entanto, Trás-os-Montes e Alto Douro dispõe de algumas potencialidades: i) elevada diversidade de condições ambientais e de recursos naturais e paisagísticos; ii) experiência empírica dos agricultores sobre as condições específicas de produção; iii) aumento das hipóteses de emprego fora da exploração (pluriactividade), o que permite aumentar os rendimentos familiares; iv) áreas significativas que possibilitam a produção extensiva de carne de qualidade a partir das raças autóctones; v) aumento do valor acrescentado do leite dos ovinos e caprinos a partir do fabrico artesanal de queijo; vi) valorização da produção artesanal e dos recursos endógenos.
A minoração dos sinais de regressão da estrutura demográfica de TMAD deverá ser conseguida sem prejuízo do equilíbrio e coesão territorial, o que coloca o combate ao despovoamento das áreas rurais, sobretudo nos municípios fronteiriços e nas regiões mais montanhosas e mais afastadas das áreas urbanas, na ordem das prioridades de desenvolvimento desta região. Esta questão, que é sentida noutras zonas fronteiriças do país, é particularmente grave em TMAD, uma vez que é o próprio sistema urbano da região que está confrontado com desequilíbrios estruturais e funcionais importantes, condicionando o papel dos núcleos urbanos na organização e na estruturação do território supra municipal e na dinamização de actividades económicas, sociais e culturais. Contudo, as cidades médias e a rede urbana secundária podem garantir a articulação entre o ordenamento territorial e a preservação da natureza e promover uma melhor integração funcional e um reforço da coesão social, sendo, assim, elementos fundamentais de sustentabilidade social, económica e ambiental destes vastos territórios. Portanto, é fundamental afirmar e reconstruir um sistema urbano policêntrico, uma verdadeira rede de cidades: Cidades multimunicipais, com diferentes centralidades, em que o espaço público e as centralidades de comércio, serviços e lazer funcionam, física e simbolicamente, como nós articuladores do tecido urbano e regional e transmitem coesão às áreas de densidades diferenciadas, devendo o policentrismo ser construído a diferentes escalas geográficas.
Em termos globais, verifica-se uma dualidade de desenvolvimento entre as zonas rurais mais profundas, que têm acentuado o seu despovoamento, quer populacional, quer agrícola, estando ameaçadas da “desertificação”, e as zonas rurais próximas dos principais corredores urbanos, com melhores acessibilidades a serviços essenciais, mantendo-se estáveis ou com pequenas perdas populacionais, existindo situações de aumento de população agrícola em regime de pluriactividade. As políticas de desenvolvimento destes territórios devem privilegiar a sobrevivência das áreas abandonadas e permitir criar dinâmicas empresariais com potencialidade e dinamismo, impedindo o abandono total destes territórios. A sobrevivência destas áreas implica um esforço considerável de investimentos públicos que visem descentralizar actividades económicas para estas regiões, melhorando as condições de acessibilidade.

(Resumo e considerações finais do paper AZEVEDO, N.; RAMOS, L. (2006), “A desruralização nas regiões interiores de Portugal: o caso de Trás-os-Montes e Alto Douro”, 2.º Congresso Luso Brasileiro para o Planeamento Urbano, Regional, Integrado e Sustentável (PLURIS), 12p., Universidade do Minho, Braga. Texto integral da comunicação está disponível, no sítio do PLURIS2006 - http://www.civil.uminho.pt/planning/pluris2006/)

terça-feira, 3 de junho de 2008

Mudança no contraste e nas relações rural - urbano

Os contrastes rural-urbano modificaram-se nas últimas décadas por efeito de um conjunto de factores: a desconcentração de actividades industriais, a descentralização de algumas funções urbanas, a dispersão de serviços e equipamentos sociais, a proliferação das tecnologias de comunicação.

A mobilidade profissional, social, residencial e geográfica aumentou mas evoluiu segundo trajectórias diferentes. Na década de setenta o abrandamento dos fluxos migratórios para as metrópoles traduziu-se numa inversão de tendências anteriores, que não se verificou, contudo, no Sul da Europa o afluxo continuou. Este processo de contraurbanização não se manteve na década de oitenta e as grandes cidades e metrópoles retomaram a sua capacidade de atracção. Além do vector desenvolvimento agrícola, o vector desenvolvimento urbano teve, pois, influência relevante na transformação do espaço rural.

Hoje em dia, é consensual afirmar que as relações urbano-rural assentam numa trama muito mais complexa que as simples trocas recíprocas entre cidades e aldeias do passado. As ligações urbano-rural estendem-se para além dos limites das trocas de sentido único e denotam um tecido complexo e dinâmico de interdependências que incutem o destino dos espaços urbanos, bem como dos espaços rurais. Com efeito, é conhecido o aumento do fluxo visível e invisível de pessoas, de capitais, de mercadorias, de informação e de tecnologia entre as zonas urbanas e as zonas rurais.

No território em questão, as relações urbano-rural estão associados aos processos de diversificação socio-económica e às inter conexões entre as diferentes funções localizadas na zona urbana ou rural. Estas tendências, quando não visíveis, podem ser avaliadas pelo estudo da oferta de serviços, que se proliferaram para além dos centros urbanos tradicionais, pela análise do fluxo de pessoas, do acesso à formação e ao conhecimento, da produção de bens materiais e imateriais e do uso dos equipamentos.

A produção estatística nestes âmbitos é ainda escassa para poder avaliar/confirmar com maior clareza científica a consumação de novas relações entre os espaços urbanos e rurais, mas o senso-comum é fértil em exemplos do género. Sabe-se, com efeito, que:

  • O desenvolvimento dos centros universitários de Vila Real ou Bragança trouxeram uma nova dinâmica nos fluxos entre pessoas e conhecimento, ao longo de uma área de influência que abarca áreas impensáveis de absorver, até há poucos anos;
  • As áreas de montanha do Parque Natural do Alvão e do Montesinho prestam uma nova tipologia de serviços de lazer e de fruição da natureza que atraem uma clientela fixa de turistas, maioritariamente urbanos;
  • Os pólos secundários deixaram há já muito de estarem confinados à prestação de serviços para as populações residentes locais;
  • A implementação de equipamentos e serviços estruturantes (centros comerciais, espaços de lazer e recreio, espaços culturais) tiveram um forte efeito no surgimento de fluxos provenientes de toda a região mas também de regiões vizinhas, criando novas relações entre os espaços urbanos e os espaços rurais;
  • A melhoria das redes de comunicação e das possibilidades de mobilidades tornou possível a muitas famílias fixar a sua residência num meio rural, embora estejam empregados no pólo comercial/industrial mais próximo, etc.

A par do que já se verifica noutras regiões da Europa, a tendência actual é a do aumento da dimensão dos pólos urbanos centrais ou secundários, que constituem cada vez mais uma alternativa de destino para os novos emigrantes dos espaços rurais, ainda que continuem a manter o contacto privilegiado com as suas origens, não apenas devido à melhoria das infra-estruturas físicas e da acessibilidade, mas também graças ao progresso das tecnologias de comunicação. De tal modo que hoje já se anuncia o tempo das cidades médias de Trás-os-Montes e Alto Douro (Vila Real, Bragança, Chaves, Lamego, Mirandela, entre outras), ao mesmo tempo que se assiste a um crescente estrangulamento do emprego e de condições de habitabilidade nas grandes metrópoles. A reflexão actual sobre estas condições está muito acesa, apontando para uma viragem a favor da organização polinucleada do território urbano, fortalecendo os centros urbanos de pequena e média dimensão como pólos incentivadores de inovação em face da mudança constante, de forma a garantir o desenvolvimento sustentável das áreas rurais e, ao mesmo tempo, reconstruir e preservar as especificidades urbanas.

Considerando que a diversificação das economias urbanas e a extensão das bacias de emprego têm vindo a aumentar, esperemos que com isso, a flexibilidade do mercado de trabalho e as oportunidades de vida no Interior, sobretudo para as populações locais, também tenham um novo impulso de forma a aumentar a sustentabilidade do interior, quer nos espaços urbanos quer nos espaços rurais, aproveitando as tecnologias como facilitadoras de “novas” possibilidades de localização e distribuição de actividades e população, bem como novas formas de criação de emprego e riqueza na região.